terça-feira, 29 de agosto de 2017

REFLEXÃO À LUZ DA FÉ E DA POLÍTICA


                                          Por Walter Fernandes

O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons... (Martin Luther King)

Admito, ainda insone, que fosse como advogado trabalhista, como professor de direito do trabalho ou ainda como mais um cidadão/trabalhador brasileiro, que jamais sonhei, mesmo em meus maiores pesadelos, que um dia presenciaria um Governo ilegítimo e corrupto, numa negociação vergonhosa com um Legislativo tão corrupto quanto, e a pedido de um empresariado descomprometido com interesses outros que não o da manutenção do próprio lucro, vilipendiar os mais comezinhos direitos sociais, como o direito a uma justa remuneração e a uma jornada de trabalho decente.

Instituições sérias e especialistas em direito, e entre elas a Ordem dos Advogados do Brasil, a Associação do Magistrados do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho e até mesmo a Organização Internacional do Trabalho, manifestaram-se contra a reforma trabalhista. A Igreja Católica, maior especialista mundial em humanidade (Paulo VI), também se posicionou contra as reformas, pois estas nada trazem em favor das pessoas. Nada adiantou.

Sob o argumento falacioso de se aprimorar a legislação trabalhista e de viabilizar novas contratações, afrontou-se os princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Valorização do Trabalho, alterando a lei de forma a autorizar, por exemplo, o pagamento de salário inferior ao mínimo legal, a possibilidade do empregado “negociar” diretamente com seu empregador condições de trabalho que contrariem a própria lei, chegando ao absurdo de proibir que o  Judiciário Trabalhista interprete a lei quando da análise dos processos sob sua jurisdição. E isto tudo justificado sob o argumento da busca da “modernização das relações de trabalho”!

O mundo assiste estarrecido não só à decadência econômica, mas principalmente a decadência moral, do país que há até pouco tempo era a grande “vedete” do cenário mundial. Vimos desfalecer, da noite para o dia, o Estado Social, pondo-se abaixo o patamar mínimo civilizatório garantido pela legislação trabalhista, tudo isso, em favor de uma classe econômica que busca o lucro a qualquer custo, mesmo que à miséria de seus “colaboradores”. Sob o pretexto de melhorar a economia, retiram-se  direitos sociais ao mesmo tempo em que nada se faz para reduzir a maior taxa de juros do planeta (380% ao ano) e uma carga tributária absurda que que compromete mais de 36% do PIB nacional, ou ainda quatro meses de trabalho por ano de cada trabalhador brasileiro.

Que governo é esse!! Quem o legitimou-o a fazer, a toque de caixa, a desestruturação do estado social, reduzindo-o ao mínimo? Reforma trabalhista e previdenciária que só retiram direitos de quem trabalha, reforma da educação que desonera o estudante de pensar,  desmonte do sistema sindical sem a criação de outros mecanismos de defesa dos direitos do trabalhador, precarização da Justiça do Trabalho, retirando-lhe o poder de julgar! A quem tudo isto interessa?
Escrevo este texto estarrecido com a aprovação da reforma trabalhista votada pelo Senado. Mas o que mais me estarrece é o silêncio nas ruas.

"Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada" (Trecho do poema de Eduardo Alves da Costa atribuído ao russo Vladimir Maiakóvski)
Walter Fernandes – Pres. Conselho de Leigos da Arquidiocese de Maringá e advogado do SINCOMAR


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