Quase dois anos e meio após entrar em vigor, a Lei
Anticorrupção — que trouxe penas mais duras a pessoas jurídicas — resultou
apenas em uma multa de R$ 6.000 a uma microempresa no país. O dado consta no
Cadastro Nacional de Empresas Punidas, criado para ser abastecido por União,
Estados e municípios com as sanções aplicadas a empreendimentos.
Segundo o cadastro, apenas a empresa Willian de
Andrade Bullerjanh-ME, de Cariacica (ES), foi punida. A sigla ME significa
microempresa, segmento que inclui empresas com faturamento anual de até R$ 360
mil. Ela foi multada no último mês de janeiro pela Secretaria de Controle e
Transparência do Espírito Santo por “perturbar licitação”.
Ao UOL, o Ministério da Transparência, Fiscalização
e Controle (ex-Controladoria-Geral da União) –responsável pela manutenção do
cadastro– confirmou que os dados disponibilizados no sistema estão atualizados.
Segundo o órgão, na esfera federal, existem hoje em curso 30 processos
administrativos de responsabilização de empresas com base na Lei Anticorrupção.
“A expectativa do MTFC/CGU é que, com a maior
difusão da norma e do cadastro no cenário nacional e o resultado de processos
de responsabilização, que estão em andamento nos diversos órgãos e entidades
públicos, o número de empresas divulgado no CNEP aumente substancialmente nos
próximos meses”, informou a pasta.
O ministério informou que tem oferecido apoio a
gestores para que ponham em prática a lei e assim punam e incluam mais empresa
no cadastro. “Para isso, tem realizado interlocução com agentes públicos em
diferentes esferas de governo, treinamentos para servidores estaduais e
municipais, bem como participação em eventos relacionados ao tema”, completou.
Mesmo com a escassez de punições, o órgão ressalta
que as empresas continuam sendo punidas com base em outras leis, como a das
Licitações e do Pregão, entre outras.
Empresa
retardou execução do serviço
A única empresa punida até agora, a Willian de
Andrade Bullerjanh-ME surgiu em maio de 2013 em Cariacica, na Grande Vitória
(ES).. Segundo o secretário de Estado de Controle e Transparência, Eugênio
Ricas, a multa foi aplicada na empresa por “perturbar licitação”.
“Após se sagrar vencedora em diversas licitações na
modalidade de pregão eletrônico, a empresa não respondeu ao chamamento público
para apresentar a documentação necessária à sua habilitação e, fosse o caso,
assinar o respectivo contrato. Isso retardou a formalização do contrato e,
consequentemente, a execução do serviço que o Estado pretendia contratar”,
informou.
O UOL tentou contato com a empresa desde
quarta-feira (25), mas o telefone informado não completou nenhuma das ligações.
Um e-mail foi mandado ao contato do responsável, mas o endereço também se
encontra com problema. A empresa não possui nenhum outro contato na Junta
Comercial nem tem perfil em redes sociais ou site oficial.
Além da primeira multa do país, o secretário disse
que outra já foi aplicada e deve ser publicada em nos próximos dias. “Já temos
esse outro processo que resultou em uma multa de R$ 719 mil. Essa foi a uma
empresa do ramo de fornecimento de câmera de videomonitoramento, do Mato
Grosso. Nesse caso, eu estava em outra secretaria, e o representante da empresa
ofereceu propina e foi preso em flagrante”, contou.
Ricas alega que uma das ferramentas responsáveis
pela ação anticorrupção no Estado se deveu à criação de uma “subsecretaria de
integridade governamental e empresarial”, que ficou responsável pela adoção das
medidas propostas pela nova lei. “A partir daí, toda denúncia de linha de
corrupção passou a ser encaminhada a ela, que faz uma análise em primeiro plano
e, se comprovado algum indício, é instaurado um processo”, contou.
Lei
sozinha não adianta
Segundo o professor de direito empresarial e
advogado Giovani Ribeiro Rodrigues Alves, a quase inexistência de condenações
até o momento não quer dizer que a lei “não pegou ou não pegará”.
“A Lei Anticorrupção pode ter tido uma ótima
intenção com seus princípios, disposições e penas, mas de nada adianta se a
realidade prática não absorver tal intenção. Uma lei, sozinha, é insuficiente
para corrigir um problema tão generalizado. Junto com a lei devem ser criados
programas de conscientização para toda a população, desde as etapas iniciais do
processo de formação intelectual”, disse.
Alves aponta dos fatores para justificar o pouco
número de empresas punidas. “Um: os atos de corrupção não são fáceis de
identificar, em regra. Portanto é preciso fornecer condições estruturais aos
órgãos de fiscalização para que consigam efetivamente apurar. Apenas dessa
maneira será possível obter investigações profundas que tragam condições para o
devido julgamento. Dois: a inexistência de condenações até o momento também
pode ser atribuída ao fato de o Poder Judiciário ainda não ter a estrutura
necessária para que possa dar celeridade aos processos e aos julgamentos de
ações e recursos”, afirmou.
O
que diz a lei
A Lei 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção,
foi sancionada em agosto de 2013 e entrou em vigor em janeiro de 2014 e foi
regulamentada no dia em março de 2015. À época, a lei foi elogiada por
juristas, que comemoraram a sanção da presidente Dilma Rousseff, mas já
ressaltavam que o texto aprovado era “confuso”.
Foi a lei, por exemplo, que garantiu os acordos de
leniência, que reduzem punições a empresas que cooperem em investigações.
Além deles, houve a adoção da responsabilidade
objetiva (empresas podem ser responsabilizadas em casos de corrupção,
independentemente da comprovação de culpa), penas mais rígidas (com multas de
até 20% do faturamento bruto anual) e maior abrangência na aplicação (servindo
para governos municipais, estaduais e federal).
Fonte:
UOL
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