. Por Clemente Ganz Lúcio, no site
Brasil Debate
O projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados
promove uma devastação dos direitos trabalhistas, individuais e coletivos. Em
apenas duas semanas, os deputados rasgaram o projeto encaminhado pelo poder
Executivo e fizeram uma radical mudança no sistema de relações de trabalho, sem
qualquer discussão com a sociedade. Alteraram, com a proposta, os instrumentos
e regras que regem as relações sociais de produção e a distribuição econômica,
construídos em um século de luta social e política.
As mudanças propostas atingem o papel dos sindicatos
e a relação deles com os trabalhadores, o processo negocial, os limites do
negociado e a relação com a legislação, o conteúdo dos direitos, o papel da
justiça. O objetivo é dar ampla proteção às empresas, eliminando obstáculos,
como o direito definido em Lei, o sindicato e a Justiça do Trabalho.
O movimento sindical já chegou a debater com
empresários e governos mudanças nas relações de trabalho no Brasil, tema pouco
tratado no Congresso Nacional. Nas discussões, ficou claro que é fundamental
avançar em regras que ampliem a representatividade das entidades sindicais,
aumentem a participação direta dos trabalhadores desde o local de trabalho,
fortaleçam e ampliem o papel das negociações e dos acordos coletivos (local, setorial,
nacional), deem maior celeridade, agilidade e segurança às soluções dos
conflitos, entre outros aspectos. Diversas propostas debatidas poderiam compor
um verdadeiro projeto de modernização.
A propositura que passou na Câmara, no entanto, visa
a criar condições institucionais para a redução estrutural do custo do
trabalho. Com esse objetivo, quebra os sindicatos, instrumento essencial para a
construção dos direitos trabalhistas, proteção dos trabalhadores e promoção de
reequilíbrio na correlação de forças entre capital e trabalho.
Inúmeros estudos mostram o papel essencial que os
sindicatos tiveram na construção das sociedades modernas, colaborando
imensamente para torná-las menos desiguais, com mais direitos sociais e
coletivos etc. Há também muitos trabalhos que mostram a rigidez (leia-se
proteção) que os sindicatos impõem à queda da taxa de salários.
No Brasil, há atualmente 11.700 sindicatos de
trabalhadores, dos quais 8.800 representam os trabalhadores urbanos e 2.900, os
rurais. Cerca de 33% estão na região Sudeste, 27% no Nordeste, 23% no Sul, 10%
no Centro-Oeste e 7% no Norte. Essas organizações representam cerca de 50
milhões de trabalhadores. Se incluídas a representação patronal e as entidades
da estrutura vertical, são cerca de 17 mil entidades, que ocupam
aproximadamente 120 mil pessoas.
Esses e outros dados fazem parte da Nota Técnica
177, publicada pelo DIEESE, A importância da organização sindical dos
trabalhadores (disponível aqui). O estudo mapeia o conteúdo de mais de 56 mil
convenções coletivas e 308 mil acordos coletivos de trabalho celebrados entre
2007 e 2017 e mostra que 93% dos instrumentos tratam de questões salariais,
como gratificações, adicionais, auxílios; 89% abordam o contrato coletivo de
trabalho (admissão e demissão); 87% referem-se às condições de trabalho, normas
de pessoal e estabilidade; 89% regulam a jornada de trabalho (duração,
distribuição, controle e faltas); 70% tratam das férias e licenças; 85% regulam
questões de saúde e segurança; 92% regulam as relações sindicais, além de
definirem regras paras as negociações, solução de conflito, entre outros.
A história mostra o papel e a importância dos
sindicatos. A relevância reconhecida dessas entidades fez da organização
sindical um direito humano fundamental, normatizado em várias convenções da
Organização Internacional do Trabalho (OIT). Com o projeto aprovado na Câmara,
o Brasil se desconecta e se distancia do processo civilizatório e faz um
caminho regressivo rumo aos tempos de escravidão.
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